Petista consegue feito inédito ao derrotar candidato à reeleição e se torna o primeiro a vencer três eleições presidenciais na Nova República
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) venceu, neste domingo (30), a eleição para a Presidência da República. O petista retorna ao Palácio do Planalto 12 anos após o fim de um ciclo de dois mandatos.
Lula derrotou o atual presidente Jair Bolsonaro (PL), que tentava a reeleição. É a primeira vez que um presidente no cargo é derrotado ao tentar se reeleger, desde que o instrumento foi instituído, em 1997. Com o resultado, o petista também se consagra como o primeiro a vencer três eleições presidenciais na Nova República.
A vitória de Lula foi matematicamente confirmada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) às 19h54. Com 99,98% das urnas apuradas, o petista reunia 60.335.006 votos (o equivalente a 50,90% dos votos válidos). Já Bolsonaro tinha 58.200.224 (ou 49,10%).
É a disputa mais apertada da história do país desde a redemocratização, superando, inclusive, o pleito de 2014, quando a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) derrotou Aécio Neves (PSDB) por menos de 3,5 milhões de votos (51,6% a 48,4%, uma diferença de 3,2 pontos percentuais).
O atual presidente liderou a maior parte do tempo da apuração, quando o peso das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste foi maior. Mas sofreu a virada com 67% das urnas apuradas, na medida em que estados das regiões Norte e Nordeste começaram a avançar na totalização dos votos.
Até a última atualização desta reportagem, 1.769.423 eleitores votaram em branco (1,43%) e 3.930.304 anularam o voto (3,16%). Considerando o total de eleitores aptos a votar, 20,58% se abstiveram (32.180.897).
O resultado de Lula foi construído sobretudo pela vantagem conquistada no Nordeste, região que concentra 42,39 milhões de eleitores (27,10% do total). O petista também superou Bolsonaro nos estados mais populosos do Norte.
O petista também derrotou Bolsonaro nos estados mais populosos do Norte e em Minas Gerais – considerado o “swing state” brasileiro, juntamente com o Amazonas. Desde 1989, o presidente eleito sempre venceu nos dois estados. Já Bolsonaro teve seu melhor desempenho nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste.
Neste segundo turno, Lula recebeu apoio da terceira e do quarto candidatos mais bem posicionados no primeiro turno da corrida presidencial: a senadora Simone Tebet (MDB) e o ex-ministro Ciro Gomes (PDT), que terminaram a disputa com 4,16% e 3,04% dos votos válidos, respectivamente.
A primeira chegou a fazer campanha enfática para Lula no segundo turno, enquanto o outro deu um apoio envergonhado, manifesto em vídeo publicado nas redes sociais sem sequer citar o nome do ex-presidente.
“Esta não é uma vitória minha, nem do PT, nem dos partidos que me apoiaram nessa campanha. É a vitória de um imenso movimento democrático que se formou, acima dos partidos políticos, dos interesses pessoais e das ideologias, para que a democracia saísse vencedora”, disse Lula em seu primeiro discurso depois de eleito para seu terceiro mandato.
“A partir de 1º de janeiro de 2023, vou governar para 215 milhões de brasileiros, e não apenas para aqueles que votaram em mim. Não existem dois Brasis. Somos um único país, um único povo, uma grande nação. Não interessa a ninguém viver numa família onde reina a discórdia. É hora de reunir de novo as famílias, refazer os laços de amizade rompidos pela propagação criminosa do ódio. A ninguém interessa viver num país dividido, em permanente estado de guerra. Este país precisa de paz e de união”, afirmou.
Apesar da vitória nas urnas, Lula deve enfrentar um país ainda mais dividido do que aquele que pegou em seus outros mandatos. Para derrotar Bolsonaro, foi necessário construir um amplo arco de aliança, envolvendo inclusive adversários históricos, como o próprio vice eleito, Geraldo Alckmin (PSB). Acomodar interesses tão difusos será um dos maiores desafios da nova gestão petista.
No plano econômico, compatibilizar a promessa de retomada de políticas públicas robustas com restrições fiscais é uma das preocupações latentes entre agentes econômicos. Em um contexto de amplos desafios de governabilidade, considerando a configuração da Câmara dos Deputados e do Senado Federal para a próxima legislatura, os custos podem ser ainda maiores.
Lula também assume com o estigma de escândalos de corrupção que envolveram gestões petistas no passado, como o Mensalão e o Petrolão. Inclusive, o tema esteve no centro do discurso de opositores à sua candidatura, que por diversas vezes lembraram o fato de que o petista foi condenado por unanimidade em três instâncias no âmbito da Operação Lava Jato e esteve preso por 580 dias na sede da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba (PR). As condenações foram posteriormente anuladas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e os processos envolvendo Lula retornaram para estágio inicial.
Poucos minutos após a confirmação da vitória de Lula pelo TSE, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), reconheceu o resultado e disse que “é hora de desarmar os espíritos e estender as mãos aos adversários, debater e construir pontes”.
“O Brasil deu mais uma demonstração da vitalidade da sua democracia, da força das suas instituições e de nosso povo. A vontade da maioria manifestada nas urnas jamais deverá ser contestada e seguiremos em frente na construção de um país soberano, justo e com menos desigualdades”, afirmou.
Biografia
Luiz Inácio da Silva nasceu no dia 27 de outubro de 1945, em Garanhuns (PE). Sétimo filho de Eurídice Ferreira de Melo, a dona Lindu, e de Aristides Inácio da Silva, ele foi registrado apenas alguns anos depois, em 6 de outubro – esta é a data que ficou constando em seus documentos.
Lula tem uma longa trajetória na política brasileira. Metalúrgico, tornou-se o líder sindical que comandou as greves no ABC paulista, entre 1978 e 1980. É fundador do Partido dos Trabalhadores (PT) e o principal quadro do partido.
Lula foi deputado federal constituinte, de 1987 a 1991, e presidente da República por dois mandatos, de 2003 a 2007 e de 2007 a 2011. O petista só se elegeu presidente na quarta tentativa. Perdeu para Fernando Collor de Mello, no segundo turno em 1989, e para Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 1994 e 1998, ambas as vezes no primeiro turno.
Foi finalmente vitorioso em 2002, derrotando José Serra (PSDB) no segundo turno. Em 2006, foi reeleito novamente em segundo turno contra Geraldo Alckmin (PSDB). Fez sua sucessora, Dilma Rousseff (PT), em 2010, que foi reeleita, mas depois sofreu impeachment em 2016. Agora retorna ao Palácio do Planalto após um hiato de 12 anos.