Projeto de Lei propõe mais de R$ 4 bi em apoio à cultura. Novas leis de financiamento cultural privilegiam verbas diretas
Assinada pelo senador Paulo Rocha (PT-PA) em conjunto a outros senadores do partido, o projeto de Lei Paulo Gustavo prevê que os setores de cultural e audiovisual recebam o valor de R$ 4,3 bilhões até o final de 2022.
Um novo projeto de lei voltado ao setor cultural tramita agora no Senado Federal. Trata-se da Lei Paulo Gustavo, que prevê R$ 4,3 bilhões para o setor cultural até o final de 2022. Desse total, R$ 2,8 bi seriam para o setor audiovisual – duramente penalizado pela paralisação da Ancine desde 2019 – e o restante para outras áreas do setor cultural.
O PL segue nos mesmos moldes da Lei Aldir Blanc. Criada em 2020, esta lei foi elaborada pela deputada Jandira Feghali (PCdoB) unindo uma série de projetos que estão à época em tramitação na Câmara. Por meio dela, estados e municípios criam editais voltados à produção cultural e à preservação de espaços fechados em decorrência da pandemia e distribuem as verbas de maneira direta, ou seja, sem a intermediação de um patrocinador. Tanto no caso da Lei Paulo Gustavo – que leva o nome do artista que morreu dia 4 de maio, exatamente um ano depois do compositor – quando na Aldir Blanc o dinheiro vem do Fundo Nacional da Cultura (FNC), onde são alocadas verbas para serem utilizadas pelo Governo Federal no setor.
Mas qual a diferença do patrocínio direto para as verbas incentivadas?
O patrocínio direto, como explicado acima, distribui o dinheiro diretamente ao produtor cultural, por meio de um edital. Já no caso das verbas incentivadas o produtor acessa o dinheiro por meio de uma empresa privada que decide patrocinar determinada instituição ou atividade cultural por meio de uma lei de incentivo. Desta forma, a empresa, ao invés de pagar uma parte dos impostos diretamente à União ou governo local, aloca aquele recurso para a iniciativa cultural.
O que é melhor: a verba direta ou incentivada?
A Lei Rouanet, criada em 1991, teve um papel importante na reativação do mercado cultural brasileiro. No entanto, é sabido que a lei acabou criando uma série de distorções – algumas delas corrigidas em anos recentes. As principais críticas se devem ao fato de o dinheiro dos impostos serem usados como verba de marketing das empresas, que, por sua vez, acabam alocando os recursos para a cultura em eventos de maior visibilidade, a maior parte deles no eixo Rio-São Paulo.
Já a Lei Aldir Blanc, pela sua maneira de operar, permite maior descentralização da produção cultural e um acesso mais fácil a recursos, o que beneficia pequenos produtores culturais de regiões mais pobres do país e torna a produção menos dependente da agenda e do faturamento das empresas.
O resultado positivo da lei, demonstrado em estudos, indica uma tendência para este caminho no Brasil. Recentemente, o governo de São Paulo modificou o PROAC, seu programa de incentivo à cultura. A partir de agora, a verba será também distribuída diretamente ao produtor cultural.
Mas é preciso dizer que a Lei Rouanet tem uma prestação de contas estritamente rigorosa e não é verdade que os produtores culturais “mamem” nela. Captar recursos não é uma tarefa simples e em boa parte dos recursos as verbas obtidas via Lei Rouanet não são suficientes. Por essa razão, muitos produtores obtêm verbas diretas – do setor público ou privado – e estabelecem parcerias em troca de visibilidade.
É importante lembrar também que nos casos da distribuição de verbas direta há prestações de contas a serem realizadas e em ambos os casos os produtores devem dar contrapartidas sociais, o que torna as leis de incentivo uma ferramenta fundamental para o acesso à cultura no Brasil.
Por que a cultura não consegue sobreviver apenas do mercado?
O apoio a setores específicos existe, de diferentes formas, em diversos setores da economia. A modernização do agronegócio brasileiro, um dos mais produtivos do mundo, se deu pelas pesquisas produzidas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). O setor automobilístico também tem incentivos no Brasil.
Auxiliar setores econômicos é parte da realidade de qualquer país. E por quê? Porque traz ganhos. Seja por meio da arrecadação de impostos, do desenvolvimento em tecnologia e da criação de empregos.
Uma pesquisa do extinto Ministério da Cultura feita junto a ações culturais do Rio de Janeiro mostrou que a desoneração fiscal – ou seja, os impostos que o Estado não arrecada diretamente, mas envia à cultura – é lucrativa para a União. Já a Lei Aldir Blanc ajudou a conter o desemprego no setor durante a crise.
Quais os riscos de uma produção cultural dependente das verbas diretas?
Isso depende de como as coisas vão ser regulamentadas. Se o orçamento é previsto em lei, ele acaba protegido das intempéries de governos de ocasião. Mas pode haver entraves burocráticos, como no caso do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), paralisado desde o início do governo Bolsonaro, que paralisem a distribuição de recursos.
O importante – para evitar problemas – é haver sempre uma transparência da lei, no que diz respeito à distribuição de recursos e prestação de contas, e sua adequação à realidade do mercado, além da manutenção e preservação de colegiados, por exemplo, que zelem pela aplicação da lei de maneira democrática.